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Querida Leonor

Fui ao evento de apresentação desta obra no Centro de Cultura e Intervenção Feminista (CCIF/UMAR) e não resisti a comprar o livro.


Começo por falar no evento: o livro foi apresentado pela autora e historiadora Luisa V de Paiva Boleo, e pelo seu amigo, também historiador, Alexandre Honrado. Vou, infelizmente, a muito menos eventos da UMAR do que gostaria - é uma casa para mim, tendo sido lá voluntária e sempre calorosamente acolhida por pessoas que acho fascinantes e cujo trabalho admiro. Sendo a apresentação de um livro, e tendo a possibilidade de ir, não podia faltar.


Ambos os apresentadores do livro se assumiram como membros da UMAR, e ambos deram perspectivas fascinantes sobre a obra e a colecção em que esta se insere, mas também sobre a mulher sobre a qual o livro versa: Leonor d'Almeida Portugal, Marquesa de Alorna, que inspirou já As Luzes de Leonor, de Maria Teresa Horta. Nunca li As Luzes de Leonor - é um livro grande e não particularmente barato, o que me deixa sempre de pé atrás, apesar de confiar na sua qualidade.

Tendo adorado a conversa com os apresentadores - tanto a apresentação como o que tive ocasião de falar com ambos, no final -, e tendo achado as ilustrações, da autoria de André Carrilho (não o jogador, mas o ilustrador), lindíssimas - quebrei o meu book buying ban. Foi também importante para mim o facto de, na UMAR, o livro se encontrar a um preço mais acessível que nas grandes superfícies, e parte do lucro reverter para a instituição.

Foi, portanto, este o primeiro livro que li relacionado com aquela que foi uma influente mulher e poetisa portuguesa.

 
foto minha; ilustração retirada do Instagram do artista

Curiosidades históricas enormes relacionadas com a Marquesa de Alorna: descendente dos Távora. Cresci e vivo ainda perto de Belém, e conheço perfeitamente o Beco do Chão Salgado. Sei perfeitamente o que lá se passou - mas nunca soubera o porquê. A conversa com a autora e com Alexandre Honrado desmistificou os factos, e o livro também fala sobre o sucedido. Também ando há que tempos com uma enorme vontade de visitar o Palácio da Fronteira (património da Fundação das Casas de Fronteira e Alorna), e fiquei com mais ainda. E ganhei vontade de visitar a Igreja de Chelas (antigo Convento de S. Félix), em cujo convento Leonor viveu encarcerada 18 anos.


D. Leonor torna-se mulher. Vai procurar autores que falem de amor e atração. Com receio do pai apressa-se a queimar alguns versos eróticos que escreveu e que tem o bom senso de não mandar ao progenitor. D. Leonor leu certamente Dante, os sonetos de Petrarca a Laura e com grande probabilidade Boccacio, poetas do Renascimento italiano que tratam o amor físico como tema recorrente.


O livro narra brevemente a vida de Leonor, que passou por seis reinados, um terramoto, aprisionamento, exílio, invasões francesas... e como Leonor aproveitou os dezoito anos fechada num convento para ler, para aprender, para se cultivar, para escrever, sob o pseudónimo de Alcipe, e como decidiu não se tornar freira, para poder, um dia, aproveitar a liberdade.


Leonor d'Almeida Portugal casou, por perceber que, à época, precisava de casar - mas escolheu o seu marido. Passou pelas cortes, depois de liberta da vida de clausura, passou por vários países, a sua poesia foi largamente apreciada e inspirou vários nomes da literatura portuguesa, como Barbosa du Bocage, de quem era próxima, Almeida Garrett, ou Alexandre Herculano, que a admirava. Viveu quase 90 anos.

Esta jovem mulher tem sede de liberdade e depois de alguns meses de descanso e encontros com parentes e amigas, percebe que o país não está preparado para a sua abertura de espírito e rebeldia. Mas é uma mulher, não pode pura e simplesmente viajar, partir.

Um livro juvenil, é certo, mas adequado a um público adulto, e a quem, como eu, quer saber mais sobre a pessoa inspiradora que foi a Marquesa de Alorna, mas tem "receio" do livro de Maria Teresa Horta (um dia, um dia).

Esta obra insere-se na colecção "Grandes Vidas Portuguesas", da editora PatoLógico; outras mulheres homenageadas são Ana de Castro Osório, que li em pequena, e Antónia Ferreira. Consta com muitos mais nomes masculinos, despertando-me especial interesse os títulos sobre Aristides de Sousa Mendes e Almada Negreiros.

5/5

Podem comprar esta edição aqui. Ou, é claro, na UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta.

Comentários

  1. Excelente post, parece ter sido uma mulher bastante interessante
    Também gosto das ilustrações!
    E a foto que tiraste é ao pé do pão pão? :p

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    1. Qual o maior atractivo do pão pão, as 52 baguetes ou terem esplanada no Beco do Chão Salgado? :p

      Sem dúvida! Não tinha total noção, porque os livros sobre ela me assustam em dimensão - há o da Maria Teresa Horta e o da Maria João Lopo de Carvalho -, mas se tanto se escreve sobre ela, por alguma razão será :p

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    2. Pergunta difícil :p

      Por alguma razão será I guess :p

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  2. Obrigada pelo seu comentário tão bem escrito. Ainda bem que gostou desta breve abordagem à vida de uma mulher das Luzes que conseguiu não ficar com a mente empedernida. É certo que as fidalgas nos conventos/prisões tinham alguma liberdade. Sabe-se que a cela dela tinha uma janela. Leu muito. Quando saiu tinha uma vasta bagagem intelectual. Também gostei muito de escrever este livro que já recebeu dois prémios pelas ilustrações do André Carrilho. A última da 3X3 magazine. Até breve. Estou a escrever mais sobre mulheres, estou sempre, para não ficarem no esquecimento.

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    1. Cara Luísa, muitíssimo obrigada por ter por aqui passado. Embora já a conheça (maioritariamente de vista) há bastante tempo, das andanças da UMAR, é verdade que ontem fui com bastante vergonha e hesitação falar consigo. Fico muito feliz também por ter gostado da minha opinião. É uma breve abordagem sim, mas creio que a melhor para começar quando (como eu) se conhece pouco da vida desta mulher.
      Após ler este livro, li as Cartas Portuguesas da Mariana Alcoforado, e achei interessante o outro tipo de liberdade concedido a mulheres fidalgas nos conventos - os encontros com homens, com soldados.
      Ficarei a aguardar mais da sua obra, e espero reencontrá-la em breve.

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